Se fosse uma pessoa, o Facebook já estava quase a fazer 18 anos para tirar a carta. Em vez disso está a mudar de nome para Meta e a sonhar com universos virtuais.

Entretanto, as Marcas que passaram anos a comprar anúncios devem estar a ponderar a sua posição. Vão continuar a financiar o Facebook através da compra de anúncios? A Unilever deixou de o fazer, mas depois mudou de ideias.

Por outro lado, houve marcas que nem conseguiram ter presença nesta rede. Empresas que molharam o pézinho e se assustaram porque a água estava fria. Mas o erro não foi das pessoas.

A história é recorrente. Alguém diz “devíamos estar no Facebook”, e a máquina mexe para criar a página, sugerir os temas e planear os posts. Depois as coisas correm mal, ou não correm porque não houve uma voz com poder para perguntar “porquê?”.

Troquem Facebook por Instagram ou Twitter, a história é sempre a mesma.

Não é definido um propósito. Estamos naquela rede porque “toda a gente está lá”, e não por haver um alinhamento com objetivos de negócio ou vontade de formar comunidade com stakeholders relevantes.

Não se planeia recursos. É preciso community manager, é preciso designer, é preciso tempo. E é preciso alguém que resolva questões de planeamento e estratégia, consiga aprovação de campanhas.

Não se faz planeamento de crise. Vai correr tudo bem, qual poderá ser o mal? Mas depois não corre e não se pensou sobre como reagir a perguntas delicadas ou como decidir se a situação já escalou para lá do razoável.

Há uns dez anos atrás isto era compreensível, estávamos todos a aprender fazendo caminho. Os erros acontecem, o tempo passa e as crises são esquecidas. E quando já toda a gente se esqueceu, dá para participar no Instagram, no LinkedIn, até no YouTube. Porque já há uma máquina de conteúdo montada na comunicação mais tradicional, e porque por construção estas redes sociais não foram feitas para diálogo. São canais de divulgação, megafones digitais.

E uma presença que nunca teve estratégia e propósito não tem como falhar.

Empresas que planeassem voltar ao Facebook facilmente se deixariam levar por esta táctica de entreter via megafone, até porque ninguém iria querer arriscar meter o pé na água novamente. Podia estar fria e ninguém quer morrer de resfriado.

As empresas pequenas são sempre mais audazes e empenhadas, mas não estamos a falar delas.

Estamos a falar do Facebook que agora é Meta e de um conjunto de mentalidades que agora mudou. As direcções já não se deixam levar por malabarismos e acrobacias, se pagaram bilhete querem saber com o que podem contar. E questionam quem analisa e relata resultados sem nunca os ter chamado para a mesa onde discutia a estratégia.

Ficamos assim com mais um tomo de pantagruel, Receitas para o Desastre.

Os relatórios são inundados de gráficos e métricas com umas pitadas de análise qualitativa. Contamos histórias e procuramos insights para justificar caprichos de comunicação. Embelezamos histórias de empresas que querem ser ouvidas sem estar prontas para o diálogo com as pessoas. E que depois perguntam entre si como é que podem ser mais autênticas.

A nova marca do Facebook e o clima de desconfiança cada vez maior está a preparar terreno para novidades no que toca a redes sociais. Podem ser novas redes, ou pode ser a re-estruturação das que já existem. O Twitter, por exemplo, tem feito experiências com spaces (um clone do ClubHouse), newsletters (um clone do Substack) experimentou “tips”, umas gorjetas digitais.

Mas para as empresas que se deixaram assustar por tropeções do passado e que compraram estratégias ocas vai ser só mais um capítulo de oportunidades perdidas. Sem uma remodelação de cultura interna e uma introspecção sobre o que querem ser, estas empresas ficaram sempre em água tépida.

Em alguns casos esta remodelação e introspecção significa mudar completamente as hierarquias e colocar em causa os processos e métodos de trabalho. Só que num contexto como o nosso em que ainda usamos o Advertising Value Equivalency (AVE) para medir os esforços de assessoria de imprensa, não estou com esperança.

Empresas grandes não arriscam e nós como pessoas não gostamos de ser contrariados. Juntamos à nossa volta as pessoas que concordam connosco e nos alimentam o ego. Em vez disso devíamos procurar as que nos contrariam e que nos obrigam a defender melhor as nossas ideias, de modo construtivo.

Qualquer semelhança desta reflexão com a realidade é puramente intencional. O nosso país está cheio de casos de empresas que ainda não chegaram a um nível de maturidade em comunicação que lhes permita participar em redes sociais. Mesmo que algumas delas tenham conta de Instagram ou LinkedIn. Não são no entanto um caso perdido, desde que alguém se chegue à frente para liderar a comunicação de forma estratégica e com a coragem de dizer “não” aos caprichos hierárquicos.


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Bruno Amaral

Sou um Estratega Digital, dividido entre tecnologia e criatividade, a trabalhar para o Lisbon Collective e a ensinar Relações Públicas na …