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Eu sou de Comunicação. É preciso começar por sublinhar o óbvio porque muitas vezes dou por mim a ser considerado uma pessoa de tecnologia. Não sou. Antes de tudo sou um humanista que não quer ver a humanidade escrava das máquinas e das tarefas que nos matam por dentro.

A história que vou contar não vai ajudar a defender esta afirmação mas é importante que seja contada.

Eu faço estratégia de comunicação. E isto é outra afirmação que precisa de ser defendida porque o que se segue não é só sobre comunicação e não é óbvio que haja uma estratégia por trás. É sobre construir algo inovador e fazer a notícia chegar ao público certo.

Em 2019 afirmei que ter uma estratégia de comunicação é resolver problemas antes de eles acontecerem. Continuo a achar que isso é verdade num mundo ideal, mas o mundo não é ideal e a minha definição precisa de ser revista.

Vamos ver aqui que uma estratégia de comunicação também é identificar um problema e a inovação necessária para reunir stakeholders e recursos e acelerar um objectivo.

No espaço de um mês e sem orçamento, o Projecto Gregory foi lançado oficialmente e conseguiu resultados que superaram a minha expectativa.

Plano de Comunicação

Há várias formas de divulgar um projecto deste género, o obstáculo está na falta de orçamento. Por isso na primeira fase em que o Gregory era só uma prova de conceito não foi feita grande divulgação. Houve algum contacto com pessoas mais informadas sobre o tema para auscultar como seria a aceitação. A Sociedade Portuguesa de Esclerose Múltipla (SPEM) foi um desses contactos, bem como outras pessoas de comunicação como o André Correia do podcast Cruzamento. E em ambientes menos formais houve apoio de profissionais de saúde que tiveram acesso em primeira mão.

Estando provado que funcionava e que tinha um nível de segurança confortável já foi possível divulgar indo directo às comunidades.

O Público Geral nunca é objectivo de uma campanha de comunicação, e o Gregory não foi feito para todas as pessoas que se preocupam com a ciência e a saúde. Ele existe para servir públicos muito específicos e que estão presentes na homepage e na arquitectura de informação que foi aplicada no site.

A Web é feita de comunidades e só precisamos de as saber procurar. Também é preciso saber como abordar o tema por mais relevante que seja para o público. Nisso o Reddit é um exemplo muito completo, as comunidades que encontramos lá são muito claras nas suas regras de conduta.

No Twitter existe uma comunidade em torno da hashtag #NeuroTwitter, e por convite da Joana Rita Sousa, o Gregory participou num #Twitterchatpt.

Mas as comunidades não estão só nas hashtags, estão pelo HackerNews, pelo Reddit, e pelos grupos de Facebook. Este último não fez parte do plano de divulgação.

E funcionou. Entre o esforço de divulgação inicial e o plano de conteúdo feito para o Twitter, em 27 dias o Gregory teve 23 mil visitantes e mais de 80 mil visualizações de páginas.

visitantes únicos reportados pela Cloudlare
Métrica de visitantes ao site gregory-ms.com
Fonte: Cloudflare

O Brief

O problema a resolver é o excesso de informação e a falha dos nossos filtros em processar o fluxo interminável de conteúdo.

Neste caso, estamos a falar da área de Neurologia, especificamente esclerose múltipla, uma doença autoimune que devolve 8 660 resultados se pesquisarmos no Google Scholar filtrando por tudo o que foi publicado em 2021.

Ficam por isso no ar várias perguntas. Quais destes artigos são relevantes para os pacientes? Ou seja, quais é que dão pistas para melhorar a sua qualidade de vida?

Os artigos são recolhidos de várias publicações, como é que podemos ver quais estão relacionados entre si?

A investigação que é feita tem toda o mesmo foco ou cada laboratório investiga na direcção que considera melhor?

Qual é o tempo médio entre a publicação de artigos, ensaios clínicos, e aplicação de novas terapêuticas?

Não tenho qualquer intenção de dar uma resposta completa a estas perguntas, mas vamos demonstrar como podemos responder à primeira questão e fazer essa informação chegar mais depressa a médicos e investigadores em Neurologia.

Gregory MS, a investigação em forma de robot

illustration of a robot searching on a mobile with a magnifying glass

O mundo está a evoluir em direcção à automatização de tudo o que é aborrecido. E fazemos isso para passar mais tempo a investigar e desenvolver o que nos motiva e trás mais qualidade de vida. O Gregory serve para isso.

Ele nasceu para se focar em Neurologia e esclerose múltipla, mas foi programado de forma abstracta para poder ser adaptado a outros contextos.

O que ele faz é pesquisar, indexar e filtrar o que é investigação relevante para melhorar a qualidade de vida das pessoas que têm esclerose múltipla. E tem um público alvo muito definido, serve para médicos, investigadores e fisioterapeutas. E por ser um projecto aberto à inovação, existe uma secção dedicada a programadores e outros entusiastas.

Como funciona

1. Pesquisar

Pesquisar numa área tão específica é fácil. Existem apenas 10 sites que estão a ser tidos em conta como fontes de informação. Este sites foram escolhidos por ser publicações de ciência e já ter um processo de avaliação e triagem que funciona.

A pesquisa é feita várias vezes ao dia tendo por base estes termos: Multiple Sclerosis, autoimmune encephalomyelitis, encephalomyelitis, immune tolerance, myelin .

2. Indexar e Organizar

Indexar a informação também é um processo directo. O Gregory guarda o link, título, e o abstract. Também é registada a fonte da informação e outros detalhes mais acessórios como a data de publicação.

Nesta fase de tratamento da informação aproveitamos para executar uma análise automática ao texto para identificar os termos mais relevantes no título. O Gregory faz isto com o objectivo de mostrar artigos relacionados sempre que alguém visita página de detalhe de um dos artigos.

Como este, por exemplo, onde podemos ver quais foram os termos identificados como “Noun phrases” e os artigos que partilham esses termos de pesquisa.

3. Filtrar e Distribuir

Na altura de filtrar a informação é que está a magia. O Gregory não é uma inteligência artíficial mas tem uma componente de machine learning.

O António Lopes, do Podcast “Um Sobre Zero”, ajudou este projecto com um script que aplica análise estatística na base de dados. Essa análise foca-se em 3 factores: no título, no abstract, e na identificação manual dos artigos relevantes.

Com essa informação é construído um modelo de análise que determina se os novos artigos podem ou não ser relevantes para listar na primeira página do site.

Distribuir a informação é a última parte do trabalho do Gregory. Todas as terças feiras ele envia por email os artigos relevantes mais recentes para as pessoas que pediram para ter acesso à informação.

E para que o Gregory não ficasse fechado na sua caixinha que é o site, foi criada uma conta de Twitter onde ele publica automaticamente os artigos mais relevantes à medida que os encontra.

Num último passo, o Gregory tem uma secção de “observatório” para medicação e terapia que tenha vindo a ser identificada como promissora. Nesta página, ele faz a listagem dos artigos e dos ensaios clínicos que incluem o mesmo fármaco ou o nome da terapêutica.

Próximos passos

Na sua versão atual o Gregory já é bastante útil para filtrar e organizar a informação. Por isso o objectivo é continuar a divulgação e manter a porta aberta para sugestões dos utilizadores.

Mas não precisamos de ficar por aqui. Havendo oportunidade é possível utilizar a base de dados para analise estatística do esforço de investigação nesta área; fazer uma investigação profunda nos artigos relevantes para encontrar os fármacos com mais potencial; Identificar os autores para saber quem tem feito mais investigação. Não vejo que este software vá descobrir uma cura, mas acredito que pode acelerar o trabalho de quem vai poder gritar Eureka.

Agora que o Gregory existe só estamos limitados pela imaginação.

Unsplash LogoKindel Media